quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Quando João Vitor aprendeu que pessoas são vasos.


João Vitor no alto dos seus 7 anos não compreendia muito bem os adultos. Ele os achava amargos, tristes e isolados. Não tinha muito graça em ser adulto. O único que ouvia com atenção sua mãe, até porque certamente sua mãe não era adulta, dizia a si mesmo.
Um dia João Vitor volta para casa triste e encontra o olhar preocupado da mãe. Ela para o que estava fazendo e corre ao encontro do filho, que conta a história do roubo-da-bola-de-futebol-que-terminou-a-amizade. Ele gostava muito do Erick, mas não era certo ele ter sido fominha no jogo no campinho. Achava certo ter dito que não queria mais vê-lo e voltou para casa bravo, porém triste. Não fazia sentido. Ele deveria ter ficado mais feliz por ter feito isso, já que foi “Olho no olho, dente por dente”.
Sua mãe olhou para ele com candura – aquele olhar que só as mães de meninos que jogam bola no campinho à tarde sabe fazer – e decidi contar uma história para o filho:
- Quando eu era nova, minha avó sempre cuidava de mim. Era sábia, assim como tento ser com você. Minha avó contou uma vez a história dos homens-vaso. Achei estranho no início, mas depois, com o tempo, eu consegui entender. Mas o importante que minha avó ensinou foi que os amigos são como os vasos em nossas casas.
Normalmente achamos estranhas algumas casas quando entramos não é? Vemos uma decoração diferente. Ela não faz sentido para nós. Algumas casas têm tanto vaso, tanto quadro, tanta coisa que ficamos perdidos lá dentro. Outras têm pouquíssimas coisas, alguns detalhes, algum bonequinho ou um enfeite. Assim são as pessoas, assim são os homens-vasos.
Normalmente as pessoas montam suas casas sem lógica para todos. As amizades não são diferentes meu querido.
Minha avó também contou sobre como nos formamos. Cada pessoa tem uma matéria diferente, cada pessoa tem a sua forma, sua substância importante. Alguns são feitos de barro, outros feitos de vidro, outros são feitos de mais um desses, mas todos são diferentes em forma. Cada vaso tem seu jeitinho: Uns são compridos, outros são mais gordinhos. Alguns têm desenhos, outro não tem detalhe algum. Muitas pessoas são assim, únicas, porém com uma mesma forma – e que fique claro, muitas dessas pessoas são feitas para serem desvendadas
Nascemos iguais em essência, mas nos mudamos com o tempo. Assim é um vaso, enquanto areia é areia, enquanto vidro é vidro, mas um dia todos viram vasos robustos. Alguns maiores que um metro, outros mais largos que uma panela de fazer feijão, mas claro, ainda vasos.
No entanto, quando menos se espera, a vida muda os vasos. Assim como a vida muda as pessoas. Um dia talvez apareça o primeiro racho, a primeira ferida e, claro, a primeira dor. Um vaso pode ser consertado, uma ferida pode ser fechada. Porém, novas feridas surgem, e fica difícil do vaso ser consertado. Algumas delas deixam marcas, umas mais profundas do que as outras. O que antes diferenciava um vaso do outro era o principio, agora eles não são mais assim meu querido. O que muda um do outro são seus cortes. Passa a ser difícil um vaso fazer companhia para outro vaso, a menos que um vaso queira estar com outro vaso. Será isso possível?
Talvez seja o único motivo para entrarmos naquelas casinhas que falei e percebemos como elas têm sua lógica. Ás vezes um vaso só consegue encontrar novos pares naqueles que aceitam suas formas, e muitas vezes até naqueles que ainda são capazes de aceitar como eles são. Talvez eu possa dizer que um vaso com detalhes indígenas ache um espaço no cantinho, bem embaixo, para desenhar uma fada azul para aquele amigo vaso que é representa um belo conto de fadas. Fazemos isso o tempo todo, os vasos também fazem. Somos capazes apenas de criar as maiores amizades com aqueles que sabemos, no fundo, que não são perfeitos. Vasos quebrados não são perfeitos, pessoas não são perfeitas. Elas cometem erros, para os outros, e consigo mesmas. Os melhores são aqueles que mesmo depois de todos os nossos erros, não imaginaríamos outros perto de nós. Com os vasos são os mesmos, ou será que uma porcelana chinesa não poderia fazer um belo par com uma panela de baiana? Claro que sim! Basta que eles achem espaço entre si e com a mesma vontade.
Talvez seja por isso que você, João Vitor, não conseguiu entender como essa ferida não pode ser curada na vingança. Não há motivos para que o fosse, meu pequeno. Por mais que ele tenha te magoado, ele também tem uma ferida, e esta é a ferida dele, ter feito você ficar triste. Esquecê-lo não irá ajudar, mas provavelmente perdoá-lo e dizer que no fundo, vocês formam a melhor dupla juntos é o mais fácil. Talvez seja mais fácil admitir que, no fundo, vocês serão os melhores vasos juntos, cada um do seu jeitinho.

[CONTINUA] 

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